sábado, 8 de dezembro de 2012

Vinte anos depois do início da Guerra da Bósnia, Sarajevo renasce para o turismo


Quando anunciei para os amigos que Sarajevo estava em meu roteiro de viagem pelo Leste Europeu, a reação foi quase unânime: caras de espanto acompanhadas da mesma pergunta 'Bósnia? O que você vai fazer lá?'. Um deles, em tom irônico, chegou a me sugerir levar na bagagem um colete à prova de balas.
Quase duas décadas depois do fim de um conflito que deixou 70% da capital em ruínas, a Bósnia e Herzegóvina segue associada a seu passado bélico e carrega o peso de ter sido cenário de uma das guerras mais violentas dos Bálcãs, entre 1992 e 1995.
- Vista noturna da "Ponte Latina" sobre o rio Miljacka, em Sarajevo. Construída em estilo otomano no final do século 18, essa obra é um dos símbolos da capital da Bósnia e ficou famosa após o assassinato do arquiduque Franz Ferdinand, evento que daria início à Primeira Guerra Mundial Eduardo Vessoni/UOL
Embora algumas construções locais guardem até hoje marcas visíveis de metralhadoras e prédios destruídos, Sarajevo se abre para o turismo e recebe visitantes com um centro histórico bem cuidado e uma estrutura gastronômica que de longe lembram os anos de destruição e privações. Segundo dados do órgão oficial de turismo da cidade, que em 1998 recebeu 47 mil visitantes, o destino foi visitado por 231 mil pessoas no ano passado.

Entenda a Guerra da Bósnia

Ocorrida entre 1992 e 1995, a Guerra da Bósnia foi resultado de uma dissolução lenta e constante da então Iugoslávia que começou com a independência de territórios como a Eslovênia e Croácia, em 1991; e da própria Bósnia muçulmana, em 1992. Em seis de abril daquele ano, sérvios extremistas apoiados por Belgrado, a capital da ex-Iugoslávia, cercam todas as saídas de Sarajevo e dão início a uma guerra que mataria 200 mil bósnios. Mais do que um conflito religioso, como se justificavam os ataques da época, a Guerra da Bósnia foi uma tentativa desesperada de manter a união e o poder de uma 'grande Sérvia' sobre aqueles territórios balcânicos. Considerada um das mais violentas desde a Segunda Guerra Mundial, essa disputa por poder foi liderada por Slobodan Milosevic, ex-presidente da Iugoslávia que ficou conhecido como o 'carniceiro dos Bálcãs'.
Desembarcar na capital da Bósnia, cujo setor turístico ainda insiste em promover a guerra como principal atrativo, é como viver um daqueles trechos da história que estamos acostumados a ver apenas em depoimentos de jornalistas correspondentes de canais internacionais ou em capítulos de livros escolares.
É claro que nenhum viajante brasileiro sairá de casa com as malas prontas para passar as férias, exclusivamente, na Bósnia. Mas esta pode ser uma boa surpresa para aqueles que se aventuram em destinos menos óbvios e pouco contaminados pelo turismo de massa do Leste Europeu.

Sarajevo possui mais de cem mesquitas - algumas delas erguidas no século 16 sob orientação do Império Otomano -, construções europeias do final do século 19 construídas durante os anos em que o país esteve sob cuidados do Império Austro-húngaro e é endereço da famosa ponte próxima ao local em que foi disparado o tiro que mataria o arquiduque Franz Ferdinand e daria início à Primeira Guerra Mundial.

A cidade respira (e inspira) História. Com ruas que chegam a abrigar igrejas católicas, mesquitas e sinagogas a poucos metros de distância, não é de se estranhar que o destino seja declarado o ponto de encontro entre o Ocidente e o Oriente.

As atrações turísticas locais se concentram ao redor do recém reformado Saraci, um calçadão para pedestres onde o único sinal de guerra é a disputa de clientes em lojas de produtos de origem turca ou nos concorridos restaurantes com mesas do lado de fora que ficam, insuportavelmente, lotados nos finais de semana. Aliás, se for possível, evite visitar Sarajevo nesse período, pois a cidade costuma receber grupos grandes de turistas dos países vizinhos.

Construções históricas, população com altíssimos níveis de simpatia e preços convidativos. O resto são apenas velhas imagens estereotipadas que já não cabem naquele país persistente que, lentamente, tenta escrever uma nova história.

Conheça os principais atrativos históricos e turísticos de Sarajevo

Bascarsija: Esta antiga região comercial da cidade, que em turco significa 'mercado principal', é uma das áreas mais populares entre os visitantes estrangeiros. Esse setor construído no século 15 abriga construções históricas como sinagogas, mesquitas e ruelas com comércio de produtos turcos.
Bares: Para um autêntico contato com o cotidiano da cidade, os bares frequentados pelos locais é a melhor opção. O Bar Tito (www.caffetito.ba) é um dos lugares mais curiosos de Sarajevo. Localizado atrás do edifício do Museu de História, o estabelecimento faz uma homenagem ao marechal Tito e surpreende os visitantes com uma decoração temática com artigos e fotos desse ex-presidente da Iugoslávia, metralhadoras penduradas nas paredes e capacetes de soldados que servem como luminárias. Outra opção autêntica é o Barhana (www.barhana.ba), bar onde é possível tomar diversas opções de rakija, o licor local feito à base de frutas fermentadas e com alto nível alcoólico.
Bijela Tabija: Localizada no alto de uma colina dos arredores de Sarajevo, o local abriga as ruínas de um antigo forte medieval construído em 1550, aproximadamente. Afastado do centro da cidade, o atrativo costuma ser incluído nos roteiros históricos oferecidos pelas agências turísticas locais.
Catedral do Sagrado Coração de Jesus: Erguida com traços neogótico e neorromânico, em 1889, esse templo católico remanescente do período austro-húngaro é o espaço religioso mais novo do centro de Sarajevo e chama a atenção por sua fachada de pedras de tons de amarelo e vermelho e pelas torres com mais de 40 metros de altura. Embora os otomanos fossem tolerantes com a existência de outras religiões, uma das regras impostas por eles era a proibição de sinos em igrejas católicas que nesta catedral foram colocados anos mais tarde.
Chama Eterna (Vje?na Vatra): Localizado na rua Titova, no centro da cidade, este monumento é uma homenagem aos homens que libertaram a cidade do fascismo durante a Segunda Guerra Mundial. Acesa desde 1945, esta chama só foi apagada durante os anos da Guerra da Bósnia, devido à escassez de combustível.
Compras: Quem visita a cidade em busca de produtos típicos deve se frustrar com a ampla oferta de souvenirs trazidos da Turquia e de outros países como roupas e tecidos da Índia. Os destaques são o 'Mercado Coberto', construção de 1542 que abriga stands de roupas e joias, e a rua especializada em artesanato de cobre feito a mão. Ambas opções possuem entrada pelo calçadão do centro histórico.
Flor de Sarajevo: Ao longo da cidade é possível encontrar diversas pinturas em tons vermelhos que marcam locais onde ocorreram atentados contra civis durante a Guerra da Bósnia. O calçadão Sara?i, no setor histórico, e a Zmaja od bosne (conhecida também como a 'Avenida dos franco-atiradores') abrigam alguns desses trabalhos que são refeitos de tempos em tempos, como a manutenção feita em abril de 2012 em comemoração ao aniversário de Sarajevo.
Mesquita Gazi Husrev-bey: Considerado a primeira mesquita do mundo a ter eletricidade, em 1898, esse templo otomano começou a ser construído em 1531 e até hoje segue a tradição de chamar os fiéis a partir de um relógio localizado em uma torre do século 17. Este impressionante exemplar da arquitetura islâmica, cujo complexo inclui também uma fonte de purificação usada até hoje, um minarete de 45 metros e tumbas antigas, fica na ?aršija, calçadão do setor histórico.
Museu de História (Historijski muzej BiH): Embora se proponha a contar a história do país desde a chegada dos primeiros eslavos na Península dos Bálcãs, este museu parece mesmo dedicado a um único momento histórico: a Guerra da Bósnia. Seu acervo com mais de 400 mil itens enfatiza o período dos conflitos na ex-Iugoslávia, cuja exposição dedicada ao tema ocupa a maior parte do museu e abriga imagens impactantes, objetos e reconstrução de ambientes da época. Zmaja od Bosne, 5; tel.: (387) 33 210 418; de ter. a sex. das 9h às 17h e sáb. e dom. das 9h às 14h (verão), de ter. a sex. das 9h às 16h e sáb. e dom. das 9h às 13h (verão) ; entrada paga; www.muzej.ba
Museu Nacional (Zemaljski muzej BiH): Este museu é parada obrigatória para conhecer o passado pré-histórico e medieval do país, cujo acervo possui mais de cem mil peças arqueológicas como peças romanas e altares. Destaque para o jardim externo com lápides funerárias antigas e a 'Sala Azul' que guarda um manuscrito judaico do século 14 . De ter. a sex. das 10h às 17h e sáb. e dom. das 10h às 14h (de 15 de abril a 15 de out.); de ter. a sex. das 10h às 15h e dom. das 10h às 14h (de 16 de out. a 14 de abril); entrada paga; www.zemaljskimuzej.ba
Museu Sarajevo 1878 – 1918: Localizado na esquina onde Franz Ferdinand foi assassinado, em 1914, esse pequeno museu retrata o curto período do Império austro-húngaro na região e as mortes do arquiduque e de sua esposa que dariam início à Primeira Guerra Mundial. O acervo é modesto, mas abriga peças como objetos usados pelos dois, a arma e roupas que o assassino Gavrilo Princip usou no dia do atentado e o exemplar de um jornal que anunciava o ocorrido. Zelenih beretki, 1; tel.:(387) 33 533 288; de seg. a sex. das 10h às 16h e sáb. das 10h às 15 (de outubro a março) e de seg. a sex. das 10h às 18, e sáb. das 10h às 15h (de abril a set.); entrada paga.
Ponte Latina ('Latinska Cuprijal'): Construída em estilo otomano sobre o rio Miljacka, no final do século 18, essa ponte é um dos símbolos de Sarajevo e ficou famosa após o assassinato do arquiduque Franz Ferdinand, evento que daria início à Primeira Guerra Mundial.
Sinagoga Antiga: Esta construção de 1581, conhecida como Il Kal Grandi, é considerada a sinagoga mais antiga de Sarajevo e foi feita por judeus perseguidos durante o período de Inquisição. Destruída por incêndios, este edifício de pedras que também funcionou como prisão de judeus durante a Segunda Guerra foi restaurado e a última versão de 1821 possui uma basílica com três naves. O interior com arquitetura otomana e bósnia abriga um museu dedicado à cultura judaica. Velika Avlija, s/n; tel.: (387) 33 535 688; de seg. a sex. das 10h às 15h, e dom. das 10h às 15h, entrada paga.
Torre Avaz Twist Tower: Este edifício espelhado de 172 metros de altura, localizado no bairro Marijin Dvor - área financeira entre os centros histórico e moderno de Sarajevo - abriga um mirante no 35º andar aberto para visitantes. O local se localiza próximo à estação ferroviária da cidade.
Túnel da Esperança: Este corredor subterrâneo de 960 metros de extensão foi construído pela própria população durante os anos de cerco a Sarajevo como uma ligação estratégica entre a cidade e a saída para as montanhas dos arredores. Essa antiga rota de fuga e passagem de mantimentos conta, atualmente, com 25 metros de comprimento abertos para visitação pública e abriga um pequeno museu com objetos bélicos da época como fardas militares e caixas de mantimentos. Tuneli, 1 / Donji Kotorac, 34; tel.:(387) 61 213 760; diariamente, das 9h às 16h; entrada paga
Kovaci – Shahids Memorial: Este impressionante jardim abriga os corpos de mais de 1400 soldados de origem muçulmana mortos durante a Guerra da Bósnia, considerado o maior em todo o país. Acesso pela rua Jekovac, s/n.
Como chegar
A capital Sarajevo é a principal porta de entrada para quem chega de avião e seu aeroporto recebe voos provenientes das principais cidades europeias. O Brasil não conta com nenhuma rota aérea direta e o viajante deverá fazer escalas em destinos como Viena, Munique ou Istambul. Lentos e velhos, os trens locais são uma alternativa interessante para quem já se encontra em países próximos como a Eslovênia, Croácia e Hungria.
Informações turísticas
Tourism Association of Sarajevo Canton
www.sarajevo-tourism.com

City Boutique Hotel
Mula Mustafe Baseskije, 2 - Sarajevo
(387) 33 566 850
www.cityhotel.ba

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